A tia dificilmente ficava sozinha. Era uma estrela, e as estrelas estão sempre acompanhadas. Ao redor dela, havia parentes, amigos, as sobrinhas mais velhas — que atuavam como damas de companhia —, alguém que trazia um violão, alguém que tocava piano, alguém que chegava com as últimas novidades. Mas, às vezes, os outros iam almoçar e jantar, e a tia, que estava quase sempre de regime, ficava sozinha jogando paciência enquanto bebericava café com leite. Então, a menina ia sentar-se perto dela, e conversavam. A tia gostava de lhe contar coisas do passado, fatos da vida dela ou acontecidos no teatro, no lado de dentro, aquele das coxias, dos camarins, das passagens estreitas e das escadas apertadas, aquele lado escuro e abafado que os artistas habitam, tão diferente do teatro iluminado e ruidoso revelado ao público.
Marina Colasanti é a ganhadora do 13º Prêmio Iberoamericano SM de Literatura Infantil e Juvenil, a ser concedido na Feira Internacional do Livro (FIL) de Guadalajara em 2017. Também concorre ao Hans Christian Andersen, a ser revelado na Feira do Livro de Bolonha de 2018.