Lima Barreto e o Rio de Janeiro em fragmentos
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Lima Barreto, como se sabe, era um pote até aqui de mágoa. Motivos, os tinha de sobra. Mais do que meros revezes biográficos, ressentimento e frustração tiveram papel estruturante na obra do negro despossuído que, ciente de seu formidável arsenal intelectual e estilístico, tentou em vão interromper o pesadelo bacharelesco do qual até hoje não conseguimos despertar completamente.
Neste livro pioneiro, Beatriz Resende restitui ao autor de Policarpo Quaresma o que lhe é próprio, ou seja, a enraizada força de insurreição contra os cânones, o literário e tantos outros que ainda produzem exclusões de toda ordem. Prosseguia assim o trabalho de Francisco Assis Barbosa, que como biógrafo e editor das obras completas de Lima, talhou para ele o figurino do "grande autor".
Este ensaio parte daí, do reconhecimento póstumo, para apontar seus limites. E lembrar que o princípio ativo de Lima Barreto está também, ou sobretudo, no acabamento provisório da crônica ou no jorro dos diários íntimos. Numa periferia de gêneros e classificações que pode ter contribuído para seu esquecimento mas que, paradoxalmente, cimentou sua impressionante resistência, uma vez passado o rolo compressor do modernismo.
Lima Barreto implodiu convenções e, com elas, as representações do Rio de Janeiro. Beatriz Resende soube reunir estes fragmentos e, mais do que isso, nos mostrar, na primeira hora, sua rigorosa arquitetura. Aquela que hoje temos o privilégio de contemplar como o desenho nítido e delicado de uma constelação.
Paulo Roberto Pires